Em todo o mundo, os vários ordenamentos jurídicos adotam um conjunto de instrumentos de tutela ambiental que mesclam objetivos de conservação, de preservação. Uns mais antropocêntricos (Florestas Nacionais, p. ex.), outros de índole claramente ecocêntrica (Estações Ecológicas ou Reservas Biológicas, p. ex.). O primeiro dispositivo que realmente visava coibir os maus-tratos aos animais sobreveio após a emancipação política e, curiosamente, na mesma época em que se editavam as leis da abolição da escravatura.
São Paulo foi o município pioneiro, ao inserir em seu Código de Posturas, de 06 de outubro de 1886, o seguinte dispositivo:
É proibido a todo e qualquer cocheiro, condutor de carroça, pipa d’água, etc., maltratar os animais com castigos bárbaros e imoderados. Esta disposição é igualmente aplicada aos ferradores. Os infratores sofrerão a multa de 10$, de cada vez que se der a infração.
Contudo, somente após quase três décadas foi iniciada a sistematização das normas de proteção aos animais. A primeira delas foi o Decreto nº 16.590, de 10 de setembro de 1924, que regulamentava as casas de diversões públicas, dispondo em seu artigo 5º que era vedado a concessão de licenças para “corridas de touros, garraios, novilhos, brigas de galo e canários e quaisquer outras diversões desse gênero que causem sofrimento aos animais”.
Uma década depois, o decreto n.º 24.645, de 10 de julho de 1934, do então chefe do Governo Provisório, Getúlio Vargas, estabeleceu “medidas de proteção aos animais”, tanto na esfera civil, como penal. O Decreto definiu, ainda, condutas de “maus tratos” (art. 3º), sendo a primeira “praticar ato de abuso ou crueldade em qualquer animal”.
O decreto nº 24.645/34, ainda hoje, funciona como parâmetro para caracterização dos maus tratos praticados contra animais. Dentre as condutas passíveis de enquadramento penal merecem destaque as de: manter animais em lugares anti-higiênicos ou que lhes impeçam a respiração, o movimento ou o descanso, ou os privem de ar ou luz; obrigar animais a trabalhos excessivos ou superiores ás suas forças e a todo ato que resulte em sofrimento para deles obter esforços que, razoavelmente, não se lhes possam exigir senão com castigo; utilizar, em serviço, animal cego, ferido, enfermo, fraco, extenuado ou desferrado, entre outros.
A Lei de Proteção à Fauna, lei nº 5.197/67, que veio substituir o Código de Caça, lei nº 5.894/43, transformou a caça profissional em crime. A proteção aos animais ganhou status constitucional em 1988, quando a chamada Constituição Cidadão estabeleceu, em seu art. 225, § 1º, inciso VII, a proteção da fauna, com a finalidade de evitar a extinção das espécies e reforçou a proibição de crueldade contra os animais. É interessante notar que a Lei dos Crimes Ambientais não faz distinção entre os animais, criminalizando condutas que atentem contra a fauna em geral, seja silvestre, doméstica ou domesticada, incluindo no seu âmbito de incidência todos os animas que estejam em território nacional.
Como se depreende da sistemática adotada pela Lei dos Crimes Ambientais, a fauna em geral é tutelada pelo ordenamento jurídico brasileiro, independentemente de sua pressuposta “importância” para o ecossistema, não fazendo diferença entre os animais pertencentes às faunas silvestres, domésticas ou domesticadas. Por muito tempo a defesa ao meio ambiente se resumia a alegações que apenas a fauna silvestre possuiria relevância ambiental, discriminando-se, por muito tempo, a defesa dos animais domésticos.
EMILLY MESQUITA SANTOS
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