Em primeiro lugar, o que é “materialidade do delito”? O termo nos remete à matéria em seu aspecto físico. Portanto, materializar é tornar algo possível de ser apreciado, tangível. No caso de homicídio, são as provas que podem ser apresentadas e apreciadas e que caracterizam o tipo penal imputado. A principal delas, o cadáver.
Em um Estado Democrático de Direito, é admissível imputar um crime de homicídio a alguém sem a inequívoca prova da existência material de um corpo, um cadáver?
Existe possibilidade dessa situação apontar para a existência de ação penal e, ao final, haver pronúncia do acusado julgado pelo Tribunal do Júri? A resposta é SIM! Se não, vejamos.
O Código de Processo Penal preceitua, em seu artigo 413, que bastaria a existência de provas da materialidade e indícios suficientes para que o julgador, em sua análise, considerasse a existência de ação penal com a consequente pronúncia – ressalte-se que a pronúncia é decisão INTERLOCUTÓRIA, não é decisão de mérito (o mérito ficaria a cargo dos juízes “naturais”, ou seja, os jurados).
A pergunta seguinte poderia ser: - De que forma se prova a materialidade de um homicídio, se não há um laudo de autópsia, se não há um corpo para ser analisado
(exame de corpo de delito direto)? Realmente isso aponta para uma certa complexidade no caso.
No entanto, pode-se chegar à dita materialidade através de outras provas, a principal delas, a prova TESTEMUNHAL. Veja o que estabelece o artigo 167, do mencionado diploma:
“Art. 167. Não sendo possível o exame de corpo de delito, por haverem desaparecido os vestígios, a prova testemunhal poderá suprir-lhe a falta.”
Cezar Roberto Bittencourt, em seu Tratado de Direito Penal, diz existirem 3 formas de comprovar a materialidade dos crimes que deixam vestígios: exame de corpo de delito direto, exame de corpo de delito indireto e prova testemunhal. Quando não é possível o exame direto, ou seja, quando o corpo da vítima não é encontrado, permite-se a constituição do corpo de delito indireto por testemunhas, por exemplo. Havendo nos autos elementos probatórios que convençam o magistrado da existência do crime, mesmo que seja prova testemunhal, é cabível a decisão de pronúncia, levando o acusado a julgamento pelo Tribunal do Júri. Cabe ressaltar que a jurisprudência dá amparo à pronúncia mesmo quando não há prova direta da materialidade do crime de homicídio e tem aceitado a prova da materialidade baseada nas provas testemunhais.
Diante do exposto, verifica-se que existe sim a possibilidade de processamento de ação penal, a pronunciação e até mesmo a condenação (pelo Júri) de acusado pela prática de crime de homicídio mesmo que não seja encontrado o corpo. Dessa conclusão, advém a resposta ao emblemático “caso do goleiro Bruno”.
Luiz Walter Silva Oliveira é servidor do TRT20, graduado em Comunicação Social pela UFS, Pós-graduado em Direito Público e estudante do 4º período de Direito da UNIT.
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